À sombra fico amor calado ,
meu grito é nó, meu peito é fardo.
Pois teu querer, tão doce e inteiro,
se entrega aos lábios mais traiçoeiros.
Teu coração, flor de outonais,
se deita em leito de punhais,
num colo frio, sem alicerce,
que nunca amou, só se dispersa.
E eu, de longe, sou o lume
que aquece em vão teu breve costume
de crer que amor se faz medida
num molde cego, com muitas feridas.
Deitas-te, amor, sem perceber,
na cama de Procusto cruel,
que corta o que tens de mais belo
e estica a dor sob falso véu.
Ela que nunca soube amar
te força a forma, sem pesar,
molda teus gestos à mentira
e ri enquanto tua alma tira.
Te vejo dar, com mãos sinceras,
a quem destrói, a quem não te espera.
Te entregas puro, leal e mudo,
ao vão abismo de um amor raso e imundo.
E eu, que guardo em mim teu nome,
me calo mais a cada fome.
Sou tua paz que não alcanças,
sou teu refúgio em esperanças.
Enquanto em mim teu céu respira,
tu vives sob o jugo e a ira
de quem te quer não por inteiro,
mas sim quebrado, do seu jeito.
E mesmo assim, não te condeno
amar, às vezes, é pequeno,
quando se espera o justo fim
de quem se esquece de si em mim.
Mas sigo aqui ferida e firme ,
amando o que ninguém define.
Pois mesmo à margem do teu dia,
és meu lamento… e poesia.